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Gestão eficiente de contratos de obras públicas

Assim como as demais áreas de conhecimento, o direito também evolui para acompanhar as inovações tecnológicas do mundo atual. É precisamente nessa direção que está o desenvolvimento de ferramentas jurídicas para prevenir e solucionar conflitos com maior eficiência para as partes que as utilizam.

Sendo os contratos de construção e infraestrutura tradicionais fontes de litígios, a experiência estrangeira criou os denominados dispute boards para atender justamente a esse propósito. Dada a realidade brasileira de obras públicas, questione-se então: “poderia a Administração Pública também usufruir dos benefícios desse mecanismo em suas obras?”. Conforme será explicado a seguir, a resposta é positiva.

Também chamados de comitês de prevenção e resolução de disputas, os dispute boards consistem tradicionalmente em um conjunto de três técnicos que são nomeados pelas partes, no início do contrato, para acompanhar a execução da obra. Além de visitas periódicas ao canteiro e realização de reuniões de acompanhamento com as partes, os membros do dispute board também podem ser chamados para emitir decisões ou recomendações sobre pleitos que lhes sejam apresentados pelas partes.

Essas decisões ou recomendações normalmente são emitidas com grande celeridade em comparação com um processo judicial ou arbitral, garantindo que a continuidade da obra não seja prejudicada pelo impasse existente entre as partes. O dispute board, portanto, desempenha importante papel tanto na prevenção dos conflitos quanto na sua resolução, trazendo eficiência para as obras e reduzindo os prejuízos causados por um litígio.

Justamente por esses motivos, é usual que bancos financiadores de obras exijam, no contrato de financiamento, que o contrato de construção adote dispute board. Essa já é a realidade de empreendimentos financiados por instituições como o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), o Banco Mundial e a Agência de Cooperação Internacional do Japão (JICA). A Federação Internacional dos Engenheiros Consultores, que produz os conhecidos contratos padrão FIDIC, chega mesmo a incluir a previsão dos dispute boards entre suas “regras de ouro”.

Diante desse panorama, pode-se concluir que a pergunta formulada no início deste texto deve ser respondida positivamente: os dispute boards não só podem, como devem ser utilizados pela Administração Pública. Nesse sentido, podemos destacar cinco principais benefícios que a adoção dos dispute boards traria para os contratos de obras públicas.

O primeiro ponto consiste no fato de que o dispute board, no seu formato permanente, faz com que a obra seja acompanhada de perto não só pelos seus gestores, mas por estes em colaboração com o board especializado. Isso faz com que pontos de atenção, dificuldades e questões técnicas, que por vezes exigem decisões imediatas, sejam consensadas de forma técnica, gerando segurança e celeridade sobre as decisões tomadas.

O segundo ponto é que o dispute board faz as partes agirem de forma a prevenir e selecionar (filtrar) as disputas. Com isso, evitam-se pleitos frívolos e geram-se diálogos que, deixando em evidência as questões debatidas, podem levar à desistência de se litigar em arbitragem ou judicialmente sobre questões primariamente discutidas entre as partes. Há, por consequência, o aumento da possibilidade de acordos, seja por meio da melhor seleção das questões que efetivamente evoluem para pleitos, seja por meio do acatamento das decisões ou recomendações emitidas pelo board, evitando o surgimento de um litígio arbitral ou judicial.

Além disso, a se tratar de decisões ou recomendações altamente especializadas, dificilmente se colherá do Judiciário ou de um tribunal arbitral decisões que conflitem com aquelas editadas pelos dispute boards. Há, assim, uma evidente função preventiva de litígios, pois, como já se disse, além de o procedimento filtrar as questões efetivamente relevantes e fundamentadas, faz com que as partes reflitam sobre elas de maneira mais aprofundada do que o fariam se simplesmente discutissem as questões apenas em âmbito administrativo para posterior submissão a um tribunal.

Somando a essas características também a celeridade das decisões, tem-se o quarto ponto positivo: a atenção das partes e do dispute board volta-se para a execução e performance dos contratos. Centra-se nas questões que dizem respeito à efetividade da contratação e ao atendimento do interesse público final dado pelo escopo traçado. Evitam-se perdas com atrasos, impactos econômicos e demais anomalias surgidas que, via de regra, mostram-se como as principais deformidades responsáveis pelo insucesso dos projetos. Ou seja: prioriza-se a boa execução da obra.

Por fim, os dispute boards geram economia de duas ordens: uma, mais próxima ao próprio instituto, porque a resolução do conflito pelo dispute board, via de regra, custa menos do que a submissão da disputa a uma arbitragem ou ao judiciário. Essa economia se dá tanto pelo valor objetivo em si, quanto pela relação tempo-efetividade das decisões. Ademais, em um contexto mais amplo, o dispute board gera economia porque efetivamente evita, pela sua efetividade na gestão dos contratos, os famosos abandonos de obras e relicitações: o interesse público agradece.

Todos esses motivos justificam que se difunda, junto à Administração Pública, o conhecimento dos dispute boards e os benefícios de sua correta utilização. É nesse sentido que vem atuando o Infra Women Brazil, por meio de um projeto pioneiro focado na apresentação do mecanismo dos dispute boards com palestras gratuitas e capacitação dos gestores públicos em workshops direcionados às suas principais necessidades. Os eventos ocorrem em dois dias, de forma híbrida, em Belém: nesta quinta-feira (11) foi realizado o workshop com integrantes da Administração Pública e, nesta sexta (12), uma palestra aberta e gratuita sobre a cláusula de dispute board em contratos com a Administração Pública. Os eventos contam com a coorganização da OAB-PA e do PPGDDA da UFPA.

Referência: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/infra/gestao-eficiente-de-contratos-de-obras-publicas-12082022?amp

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